VLH Conceito Da Boa-fe

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    DO CONCEITO DA BOA-F NA JURISPRUDNCIA E DOUTRINA ALEMS

    11..Introduo

    Recentemente, o eminente mestre Arnoldo Wald nos lembrou da

    influncia do Cdigo Civil Alemo (Brgerliches Gesetzbuch BGB) no

    legislador do Cdigo Civil de 1916.1Ressaltou que ao introduzir o conceito da

    funo social do contrato no Novo Cdigo Civil NCC - o legislador inspirou-

    se na Constituio Federal de 1988, para a qual a propriedade tem funo

    social, e na jurisprudncia nacional que invoca o BGB ao condenar o abuso dedireito e promover a importncia da boa-f.2

    O presente artigo tem por objetivo expor o conceito da boa-f

    conforme interpretado pelas jurisprudncia e doutrina alems, mostrando,

    assim, que muitos dos aspectos j incorporados nesse conceito constituem a

    funo social do contrato idealizada pelo legislador do novo Cdigo Civil.

    Com efeito, a aplicao rigorosa da boa-f resulta justamentenaquela reduo da autonomia das partes contratantes mencionada no

    Enunciado 22 do CEJ, a saber:

    "A funo social do contrato prevista no art. 421 do novo Cdigo

    Civil constitui clusula geral, que no elimina o princpio da

    autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse

    princpio, quando presentes interesses metaindividuais ou

    interesse individual relativo dignidade da pessoa humana."3

    Por outro lado, no temos a pretenso de substituir o trabalho j

    feito pelos doutrinadores brasileiros4sobre o assunto. Alm de presunoso, isto

    1Arnoldo Wald, in:VALOR, 27.11.03, p. B-2 Empresas2ibidem.3apudTheotonio Negro/ Jos Roberto Ferreira Gouva, Cdigo Civil, Editora Saraiva, SoPaulo, 2003, 2 edio, pg. 1044

    Uma bibliografia abrangente sobre o tema encontra-se na monografia de Ester Lopes Peixoto,O Princpio da Boa-F no Direito Civil Brasileiro, Revista de Direito do Consumidor 45/03, pg.140 e segts.

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    tambm estaria equivocado, pois o conceito brasileiro da boa-f diverge, por

    vrios motivos, do conceito alemo. Fala-se, inclusive, de uma boa-f

    especificamente germnica.5

    Embora a realidade da Alemanha, um pas derrotado nas duasguerras mundiais e dividido durante 40 anos entre as potncias da guerra fria,

    seja bem diferente da realidade brasileira, acreditamos que o entendimento da

    viso alem da boa-f e sua aplicao no cotidiano naquele pas possa servir

    de lio e fonte de inspirao para os doutrinadores e magistrados brasileiros,

    na execuo da tarefa de dar vida ao recm-criado conceito da funo social

    do contrato, e, de ao mesmo tempo dar continuidade na aplicao da boa-f.

    1.1. Do significado da boa-f

    O BGB no traz nenhuma definio da boa-f, deixando, assim, a

    tarefa da elaborao de seu significado e contedo para a jurisprudncia e

    doutrina.

    Entretanto, no se pode negar a importncia desse conceito no

    sistema do direito das obrigaes do BGB. Reza o pargrafo 242:

    "Der Schuldner ist verpflichtet, die Leistung so zu erbringen, wie

    Treu und Glauben mit Rcksicht auf die Verkehrssitte es

    erfordern."

    Infelizmente, a traduo fiel dessa norma para o portugus

    impossvel, devido s diferenas sutis entre as gramticas de ambos os

    idiomas. Em sntese, a norma obriga o devedor (Schuldner) a prestar aquilo

    que ele deve (Leistung) em conformidade com a boa-f (Treu und Glauben)6,

    levando em conta os costumes do mercado (Verkehrssitte).

    Uma norma parecida, consagrada no pargrafo 157 do BGB,

    aplica-se aos contratos, a saber:

    5

    Neste sentido, Antnio Menezes Cordeiro, Da boa-f no direito civil, Coimbra, pg. 1666Jos Fernando Simo utiliza o termo "boa-f lealdade",http://www.professorsimao.com.br/artigos_simao_a_boa_fe_01.htm

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    "Vertrge sind so auszulegen, wie Treu und Glauben mit

    Rcksicht auf die Verkehrssitte es erfordern."

    Ou seja, os contratos devem ser interpretados conforme os

    imposies da boa-f, levando em conta os costumes do mercado. pacficoque essa norma se aplica tambm aos atos e declaraes unilaterais.7

    pacfico, h muito tempo, que essa norma possui um significado

    muito alm de seu teor ao p da letra. Estabeleceu-se a regra bsica, atravs

    das jurisprudncia e doutrina alems, da obrigatoriedade da observao da

    boa-f no gozo de direitos e cumprimento de deveres por todas as pessoas.8

    Entretanto, o pargrafo 242 do BGB no faculta ao magistradosubstituir as conseqncias das normas legais ou contratuais por outras mais

    "justas".9

    Tambm pacfico que a aplicao do conceito da boa-f deve

    ser em conformidade com as diretrizes e fundamentaes desenvolvidas pela

    jurisprudncia e doutrina. A boa-f impe limitaes ao exerccio de direitos

    pelo indivduo quando tal exerccio traz conseqncias evidentemente

    injustas.10

    O equivalente da boa-f no idioma alemo, Treu und Glauben

    composto de dois elementos, a saber: a fidelidade (Treu) e a f (Glauben)11.

    Define-se a fidelidade como uma postura subjetiva de

    confiabilidade, integridade e considerao face ao outro. A f representa a

    confiana do outro na presena dessa postura subjetiva.12 A juno desses

    7RGZ 169, 125; Coletnea Oficial de Jurisprudncia Civil do Supremo Tribunal Federal(Entscheidungen des Bundesgerichtshofs in Zivilsachen BGHZ), Vol. 47, pg., 78. Cita-se ajurisprudncia das coletneas pelo volume e da pgina.8Helmut Heinrichs, in: Palandt Brgerliches Gesetzbuch, Editora C.H. Beck, Munique, 1996,55 edio, pg. 2239Coletnea Oficial de Jurisprudncia Civil do Tribunal Superior do Imprio (Entscheidungendes Reichsgerichts in Zivilsachen RGZ), Vol. 131, pg. 17710BGHZ 48, 398; Tribunal Superior Federal BGH, Neue Juristische Wochenschrift NJW,Ano. 1987, pg. 1070; Tribunal Superior do Trabalho BAG, Der Betrieb- DB, Ano. 1990, pg.741. Cita-se a jurisprudncia publicada em revistas pelo volume do ano e a pgina.11

    Traduzido por "boa-f crena" por Jos Fernando Simo (ibidem)e vrios outrosdoutrinadores brasileiros.12Heinrichs, ibidem.

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    dois conceitos visa o ingresso no direito dos valores ticos prevalecentes na

    sociedade. Ela constitui a obrigao de agir em considerao com os

    interesses da outra parte, e impe um comportamento probo e leal.13

    Destarte, o conceito da boa-f exige a comparao rigorosa dosinteresses de todas as partes de uma transao em todas as circunstncias,14

    que deve incluir tambm os aspectos subjetivos. No entanto, a falta de

    culpabilidade no inibe a imposio de sanes resultando na aplicao correta

    do conceito da boa-f.15 Por outro lado, a culpa de uma das partes no

    descarta, desde j, uma ponderao dos interesses favorvel mesma.16

    importante que o conceito da boa-f do pargrafo 242 do BGB

    no seja confundido com a chamada Gutglubigkeit, tambm traduzida por

    boa-f pelos doutrinadores brasileiros. Segundo esse conceito, aquela pessoa

    que pode e deve confiar na titularidade legtima de um direito revestida de

    boa-f. Pelo contrrio, quem sabe da sua ilegitimidade para dispor de um

    direito ou de um vcio do mesmo, e esconde essa situao de seu parceiro

    contratual, age de m-f. No entanto, o conceito da boa-f do pargrafo 242 do

    BGB muito mais abrangente do que a simples inverso da m-f.

    1.2. A boa-f e os direitos constitucionais

    Diferentemente do que acontece no Brasil, a questo da influncia

    dos direitos constitucionais sobre o direito civil controversa na Alemanha.

    Segundo a doutrina dos efeitos imediatos para terceiros (Lehre

    von der unmittelbaren Drittwirkung), as normas constitucionais so proibies

    ou instrumentos de proteo, dependendo do caso.17

    A teoria dos efeitos indiretos para terceiros (Theorie mittelbarer

    Drittwirkung) afirma que o direito civil no pode incorporar as normas

    constitucionais como proibies ou instrumentos de proteo. A influncia das

    13Karl Larenz, Schuldrecht, Vol. 1, Munique 1987, 14 edio, 10 I14BGHZ 49, 15315BGHZ 64, 916

    Heinrichs, ibidem, pg. 22417Coletnea Oficial da Jurisprudncia do Tribunal Superior de Trabalho(Entscheidungssammlung des Bundesarbeitsgerichts) - BAGE 1, 193; 4, 243, 276; 13, 174

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    normas constitucionais indireta, pois tais preceitos servem como diretrizes na

    interpretao das normas do direito civil.

    Apesar da discusso acadmica sobre esse assunto, pode-se

    afirmar que o sistema constitucional de valores tem uma influncia decisiva nadefinio do teor da boa-f em cada caso.

    oportuno mencionar dois dos direitos fundamentais concedidos

    pela magna carta18alem que exercem a maior influncia sobre o conceito da

    boa-f.

    1.2.1. A liberdade da conscincia

    A liberdade da conscincia (art. 4 GG) pode constituir o direito a

    denunciar, recusar ou rescindir. No entanto, isso no se aplica quando a

    verdadeira inteno do devedor de impor sua atitude ideolgica ou poltica

    outra parte. Por exemplo, os ativistas anti-nucleares so obrigados a pagar

    suas contas de energia eltrica, mesmo quando tal energia fornecida por uma

    usina nuclear.19 Por outro lado, a justia trabalhista de Colnia concedeu

    sentena favorvel a um funcionrio de origem judaica que se recusou a

    colaborar em uma pesquisa encomendada pelo Iraque, na poca sob a

    liderana de Saddam Hussein.20O direito constitucional impe a investigao

    rigorosa de todas as circunstncias do caso, inclusive a comparao dos

    interesses do credor em receber, com os escrpulos do devedor. A norma

    constitucional no implica nenhum privilgio geral da conscincia do devedor

    face ao interesse do credor.

    1.2.2. A isonomiaO princpio de isonomia (art. 3 GG) no aplicvel em geral no

    mbito do direito civil, pois tal princpio constitui uma obrigao apenas para os

    rgos estaduais. No entanto, existem normas do prprio direito civil que

    impem a isonomia entre os contratantes, tais como, no direito societrio, o

    pargrafo 35 BGB, ou, no direito trabalhista, o pargrafo 611 BGB.

    18A constituio alem se chama Lei Fundamental (Grundgesetz) - GG19Tribunal Regional de Hamm, NJW 1981, 2472; Tribunal da Comarca de Dortmund, NJW1981, 764

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    No entanto, a boa-f pode impor o tratamento igual dos credores

    caso os recursos do devedor sejam insuficientes para satisfazer todos os

    credores.

    A isonomia se impe administrao pblica quando esta faz usode meios do direito civil no desempenho de suas funes,21mesmo quando tais

    atribuies so terceirizadas22.

    1.3. Das funes especficas da boa-f

    Uma vez que o prprio BGB no define o conceito da boa-f, faz-

    se necessrio especificar as funes da mesma. Num primeiro passo,

    oportuno elaborar os efeitos especficos da boa-f.

    No h unanimidade na doutrina sobre o nmero de funes

    especficas da boa-f. Todavia, pode-se afirmar a existncia de trs funes

    bsicas, a saber:

    1.3.1. Funo regularizadora (Konkretisierungsfunktion)

    O pargrafo 242 do BGB determina a maneira que as obrigaes

    sero cumpridas, complementando, assim, as demais normas do captulo do

    BGB que trata das obrigaes.

    1.3.2. Funo complementar (Ergnzungsfunktion)

    O pargrafo 242 do BGB fundamenta uma gama das mais

    variadas obrigaes secundrias que visam proteger os interesses da outra

    parte de uma transao.

    1.3.3. Funo limitadora (Schrankenfunktion)

    A boa-f imps limites imanentes a todos os direitos e deveres.

    Como ser exposto adiante, a boa-f fundamenta o exerccio ilcito de direitos

    em todas as suas variaes.

    20

    NJW 1991, 100621BGHZ 29, 76; 36, 91; 65, 28722BGHZ 52, 326; 65, 287

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    1.3.4. Funo corretiva (Korrekturfunktion)

    O princpio da eliminao do fundamento do negcio,

    desenvolvido a partir do pargrafo 242 do BGB, possibilita a adaptao de

    contratos quando da alterao significativa das circunstncias da contratao,caso a vigncia dos termos contratuais venha a se tornar insuportvel para

    uma das partes. Cabe aqui tambm a resciso de contratos de longo prazo por

    motivo justo.

    1.4. Da dispositividade da boa-f

    Embora a boa-f seja indispositiva, as partes podem conveniar

    regras contrrias boa-f, por exemplo, a distribuio unilateral do risco de umempreendimento.

    No processo civil, o juiz deve sempre considerar os aspectos da

    boa-f ex officio.23 Caso se infira a aplicao da rplica do ru, em vez da

    inicial do autor, cabe ao ru o nus da prova.

    1.5. Dos limites da boa-f

    O supra-citado pargrafo 157 do BGB visa orientar a interpretao

    dos entendimentos das partes contratuais e de estabelecer seus sentidos e

    abrangncias. O pargrafo 242 do BGB, por sua vez, estipula medidas

    objetivas que influenciam a existncia, o contedo, bem como as modalidades

    das obrigaes, independentemente da vontade das prprias partes. Tais

    medidas so aplicveis tambm nas relaes no oriundas de atos de vontade.

    Resumindo, enquanto o pargrafo 157 regulamenta a natureza jurdica da

    vontade (das rechtliche Wollen), o pargrafo 242 trata da natureza jurdica do

    dever (das rechtliche Sollen).24

    Embora os valores de ambas as normas sejam idnticos e

    interdependentes, a vontade das partes tem de ser estabelecida de antemo

    para possibilitar a aplicao do pargrafo 242 no relacionamento entre as

    mesmas.

    23BGHZ 3, 103; 31, 84; 37, 15224BGHZ 16, 8

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    As normas tratando dos bons costumes25constituem limites para

    o pargrafo 242 do BGB. No entanto, o padro dos bons costumes mais

    rgido do que o da boa-f. Assim, qualquer infrao dos bons costumes sempre

    contraria a boa-f, mas nem tudo aquilo que contraria a boa-f

    necessariamente incompatvel com os bons costumes.

    22..Do cumprimento das obrigaes

    Como j expusemos, o pargrafo 242 do BGB regulamenta as

    modalidades do cumprimento das obrigaes, ou seja, "a maneira que" uma

    obrigao deve ser cumprida. O devedor h de cumprir as obrigaes no

    somente ipsis litteris, mas tambm em conformidade com o propsito do

    relacionamento.

    Destarte, proibido o cumprimento de uma obrigao em horrio

    ou em lugar inadequado. Na impossibilidade de cumprimento de hora e/ou

    lugar, novos horrios e lugares devem ser remarcados. O parcelamento de

    uma dvida pode contrariar a boa-f, se o mesmo onera o credor

    desnecessariamente, criando, por exemplo, despesas administrativas

    adicionais. Por outro lado, o devedor pode exigir o parcelamento de suasdvidas com base na boa-f se for necessrio para preservar seus interesses

    protegidos pela lei.26Da mesma forma, o devedor pode exigir pagamento sob

    forma de cheque (com fundo) em vez de espcie.27

    33..Dos direitos e deveres secundrios

    No sistema de direito civil alemo os deveres secundrios

    complementam as obrigaes principais.

    3.1. Da fundamentao dos direitos e deveres secundrios

    Tais deveres secundrios tm sua origem ou nas declaraes de

    vontade das partes, ou em normas legais, tais como os pargrafos 368, 402,

    25

    pargrafos 134, 138 e 826 do BGB26BGH NJW 1977, 235827RGZ 78, 142

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    444, 618 e 666 do BGB. No entanto, a fonte principal dos deveres secundrios

    o conceito da boa-f, conforme o pargrafo 242 do BGB.

    Alm de obrigar o devedor a cumprir em conformidade com o

    conceito da boa-f, o art. 242 do BGB exige um comportamento que preserva avida, a sade, bem como o patrimnio da outra parte.

    Da extrai-se uma gama de deveres secundrios, tais como

    deveres de informar, consultar, esclarecer, advertir, colaborar, abster, cuidar,

    assistir e/ou proteger, conforme o caso especfico.

    Tais encargos no so restritos s relaes obrigacionais. Por

    exemplo, a boa-f constitui, atravs do pargrafo 242 do BGB, deveressecundrios daquele que deve uma penso alimentar, ou por invalidez, a

    outrem.28

    Embora seja necessrio um relacionamento obrigacional para

    constituir deveres secundrios, os mesmos podem surgir antes da obrigao

    principal. Assim, o incio de negociaes contratuais j cria deveres de proteger

    e avisar, independentemente da concluso de uma relao contratual, cuja

    infrao resulta em direitos da outra parte a perdas e danos sob o aspecto da

    culpa in contrahendum. O exemplo clssico disso o do fregus que sofre um

    acidente em um supermercado ao escorregar em uma casca de banana.

    3.2. Alguns deveres secundrios especficos

    No existe nenhuma classificao ou terminologia para todos os

    tipos de deveres secundrios reconhecida pela jurisprudncia e os

    doutrinadores. No entanto, podemos apresentar alguns tipos de deveres

    secundrios que exercem a maior influncia na prtica do direito civil no dia-a-

    dia, a saber:

    3.2.1. A fidelidade

    O objetivo deste dever secundrio de assegurar o cumprimento

    da obrigao principal. A fidelidade obriga o devedor a praticar todos os atos

    28BGH NJW 1986, 1753; 1988, 1966

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    necessrios para preparar, efetuar e assegurar o cumprimento da obrigao

    principal. As partes devero abster-se de praticar qualquer ato que prejudica o

    objetivo do contrato.29

    Pode-se exigir do fiador a mesma fidelidade devida pelo devedorprincipal.30

    O que a fidelidade exige do devedor depende das circunstncias

    de cada caso individual. Em geral, pode-se distinguir quatro reas principais:

    3.2.1.1. O dever de preparar e efetuar o cumprimento daobrigao

    Desde a celebrao do contrato at o seu cumprimento, o

    devedor compelido a cuidar do objeto contratual. Por exemplo, ele deve

    manter as mquinas e alimentar os animais vendidos at a entrega dos

    mesmos ao comprador, mesmo no caso de atraso do recebimento por parte do

    comprador.31A mercadoria vendida deve ser embalada de forma adequada e

    enviada com todo o cuidado cabvel. O prestador de servios deve alertar o

    beneficirio de falhas em possveis servios anteriores ou preparatrios.

    3.2.1.2. O dever de assegurar o cumprimento da obrigao

    vedado s partes diminuir ou subtrair as vantagens contratuais

    da outra parte, ou pr as mesmas em risco.32Tal dever mtuo e continua em

    vigor mesmo aps o cumprimento de todas as obrigaes contratuais. O

    cedente deve abster-se de qualquer atividade detrimental realizao, pelo

    cessionrio, do direito cedido.33 desleal a concorrncia direta do vendedor de

    uma empresa ou consultoria com sua prpria carteira de clientes com ocomprador da mesma.34O fabricante de produtos industriais deve fornecer as

    partes e peas necessrias pela manuteno de tais produtos durante o tempo

    normal de uso dos mesmos.35 O locador de reas comerciais ou lojas, por

    29RG 72, 394; BGHZ 93, 3930BGH NJW 89, 139331RGZ 108, 34332RGZ 161, 338; BGHZ 16, 1033

    RGZ 111, 30334RGZ 117, 178; BGHZ 16, 7535Finger, NJW 70, 2049

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    exemplo, em shoppings, deve manter o locatrio livre da concorrncia direta.36

    vedado ao representante comercial vender os produtos dos concorrentes do

    representado.37

    3.2.1.3. Da manuteno do contrato

    Constituem infraes do dever secundrio da fidelidade a recusa

    em cumprir as obrigaes contratuais e a colocao em risco do objetivo do

    contrato. O mesmo aplica-se denuncia unilateral do contrato e recusa, pelo

    credor, de aceitar ou receber a coisa devida, sem justa causa.

    3.2.1.4. Da assistncia outra parte

    Da existncia de um relacionamento de obrigaes infira-se, at

    um determinado grau, o dever secundrio da assistncia recproca entre as

    partes. Assim, pode-se obrigar o credor a disponibilizar toda a documentao

    necessria para o devedor conseguir um crdito,38 ou fornecer todas as

    certides necessrias para a instruo das declaraes tributrias do

    devedor.39

    No entanto, o dever secundrio de fidelidade no obriga ninguma colocar seus prprios interesses em prejuzo aos da outra parte.

    3.2.2. Do dever de colaborar

    O credor e o devedor tm a obrigao de colaborar para alcanar

    o objetivo do contrato e remover os obstculos para o cumprimento do mesmo.

    Embora vise facilitar o cumprimento do contrato e a prestao do servio

    devido, esta obrigao cobrvel judicialmente como dever secundrioisolado.

    No caso dos contratos sujeitos autorizao, homologao,

    registro ou licena pblica, tal dever obriga as partes a fazer todo o possvel

    para obter tais autorizaes necessrias para poder executar o contrato. Caso

    36BGHZ 70, 8037

    BGHZ 42, 6138BGH NJW 73, 179339Tribunal de Justia de Hamm, MDR 75, 401

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    tal autorizao seja vinculada a alguma exigncia, as partes do contrato so

    obrigadas a modificar o contrato de modo a cumprir tal exigncia. Caso a

    autorizao no seja concedida, as partes, dependendo das circunstncias do

    caso especfico, podem ser obrigadas a celebrar o contrato novamente e sob

    condies que garantam a concesso da autorizao.40

    O mesmo se aplica aos contratos com pessoas menores ou

    interditadas que dependem da autorizao do tutor. No entanto, o tutor no

    obrigado a concordar com um contrato, mesmo j autorizado pela justia.41

    Nos casos de contratos que necessitam de autenticao ou

    registro notarial, as partes so obrigadas a procurar outro cartrio, caso se

    verifique que o tabelio incompetente ou no confivel.

    Quem concordar com algo obrigado a outorgar a

    correspondente autorizao de forma a observar todas as formalidades

    previstas em lei para torn-la eficaz, por exemplo, por meio de documento

    pblico.42

    No caso de uma cesso abranger por meio de interpretao da

    mesma outros direitos alm daquele especificado, o cedente obrigado a

    prestar esclarecimentos nesse sentido.43 Segundo a doutrina, o mesmo se

    aplica nos casos da falsa demonstratio.44

    3.2.3. Do dever de proteger

    O conceito da boa-f obriga as partes de um contrato a se

    comportar de modo a no lesar a pessoa, o patrimnio, ou os demais direitos

    da outra parte.45

    Embora tenha a origem no conceito da boa-f, esse dever de

    proteger a outra parte est concretizado em outras normas do BGB, tais como

    os pargrafos 536 (direito do inquilinato), 618 (contratos de prestao de

    40BGHZ 38, 149; 67, 3541BGHZ 54, 7342KG NJW 62, 106243Tribunal Superior de Hamburgo, Monatsschrift fr Deutsches Recht - MDR 1959, 12344Khler, Juristische Rundschau - JR 1984, 15

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    servios, direito de trabalho) e 701 (deveres do hospedeiro como depositrio

    fiel). No entanto, independentemente disso, vale a regra geral de que todas as

    partes contratuais tm a obrigao de tomar os cuidados necessrios para a

    proteo da sade e do patrimnio da outra parte.46

    Consoante as convenes atuais, tal dever fundamenta a

    obrigao do fumante de se abster do seu vcio na proximidade de um no-

    fumante, principalmente, se tal no-fumante for alrgico ao fumo.47

    O no cumprimento desse dever faculta outra parte reclamar

    perdas e danos com base nos princpios da culpa in contrahendoe da leso

    positiva da demanda.4849

    O dever de proteger envolve a obrigao de contratar o seguro

    necessrio. Por exemplo, o empregador obrigado a contratar seguro do

    extenso necessrio para evitar que demandas de perdas e danos contra seus

    empregados, exercendo a funo de motoristas, ameacem o sustento dos

    mesmos.50Do mesmo modo, o vendedor de carros obrigado a fornecer uma

    cobertura de seguro para os motoristas que fazem test drives.51 O joalheiro

    deve contratar seguro contra roubo e furto necessrio para proteger o clienteque deixa objetos de valor depositados com ele.52Os clubes esportivos devem

    contratar seguro de modo suficiente para seus membros, como foi decidido no

    caso de um clube de hipismo.53No entanto, um tribunal de primeira instncia

    decidiu que uma academia de jud no tem o dever de contratar seguros para

    seus lutadores.54

    45BGH NJW 1983, 281446RGZ 78, 24047Tribunal Superior de Frankfurt a.M., (Neue Juristische Wochenschrift Rechtsprechungs-Report - NJW-RR) 1994, 63348A leso positiva da demanda (positive Forderungsverletzung - pFV) um instrumento legal,desenvolvido em 1904 pelo advogado prussiano Hermann Staub para regulamentar situaesno previstas pelo BGB. Apesar de no ter sido incorporada na legislao at hoje, a pFV reconhecida pela jurisprudncia e doutrina e faz parte do sistema do direito civil alemo.49Heinrichs, ibidem, pg. 22750BAGE, 14, 228; BGH Versicherungsrecht - VersR 1964, 23951BGH NJW 1986, 109952

    Tribunal Superior de Frankfurt a.M., NJW-RR 1986, 10753BGH NJW RR 1986, 57354Tribunal de Mnster, VersR 1989, 155

  • 7/23/2019 VLH Conceito Da Boa-fe

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    3.2.4. Do dever de prestar informaes relevantes

    O dever de prestar informaes o dever de avisar outra parte,

    de forma espontnea, sobre fatos decisivos.

    Tal dever se confunde com o dever de proteger a outra parte,

    especialmente quando se trata da necessidade de avisar sobre perigos

    iminentes, tais como os efeitos nocivos de preparaes perigosas,55 ou os

    riscos inerentes ao balonismo.56

    O dever de prestar informaes somente existe na medida em

    que se deve contar com a expectativa dessa prestao pela outra parte em

    base dos costumes do mercado.57

    A jurisprudncia alem estabeleceu a existncia do dever de

    prestar informaes nos seguintes casos:

    quando as informaes forem solicitadas pela outra parte;58

    quando tais informaes forem de importncia decisiva

    para a outra parte.59 Assim, o vendedor obrigado a

    revelar voluntariamente quaisquer defeitos fundamentais

    da mercadoria a ser vendida.60 Mesmo a mera

    desconfiana da existncia de defeitos graves da

    mercadoria deve ser comunicada ao comprador.61 Quem

    ir assumir pagamentos recorrentes deve revelar as

    dificuldades financeiras existentes e/ou a iminncia de sua

    falncia;62

    55BGHZ 64, 4956BGH NJW RR 1991, 42157BGH NJW 1970, 655; BGH NJW 1989, 76458BGHZ 74, 392; BGH NJW 1967, 122259BGH NJW 1971, 179960BGH NJW 1990, 97561BGH, Nachschlagewerk des Bundesgerichtshofs in Zivilsachen, herausgegeben von

    Lindenmaier und Mhring - LM 463 N 8 (Cita-se a jurisprudncia publicada nessa coletneapelo pargrafo do BGB comentado.)62BGH NJW 1974, 1505; BAG NJW 1975, 708

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    quando h uma situao de confiana especial entre as

    partes, oriunda de laos de parentesco ou de amizade,63ou

    de relaes comerciais de longo prazo.64 Tal confiana

    tambm pode ser inspirada pela posio especial da parte

    no mercado, como no caso do banqueiro65ou do corretor

    de bolsa de valores,66do vendedor de carros usados,67ou

    do consultor.68Nesse caso, o dever de prestar informaes

    sempre existe, quando a falta de experincia ou impercia

    da outra parte em assuntos comerciais fica evidente.69

    Por outro lado, a jurisprudncia tambm tem imposto limites ao

    dever de prestar informaes relevantes. Por exemplo, no existe a obrigaodo desempregado em prestar informaes, espontaneamente, ao possvel

    empregador sobre circunstncias negativas, tais como condenaes prvias,

    gravidez, filiao ao Partido Comunista,70 ou dificuldades em empregos

    anteriores. Contudo, h a obrigao de revelar doenas que limitam a aptido

    para o trabalho de maneira expressiva.71 A execuo iminente de uma

    sentena penal deve ser informada, se a recluso resultante impede a

    prestao do servio a ser contratado.72

    44..Do exerccio ilcito de direitos

    Segundo a jurisprudncia alem, o conceito da boa-f imps

    limites inerentes a quaisquer direitos, condies legais e normas (Innentheorie

    = Teoria da inerncia).73O exerccio de um direito e/ou o aproveitamento de

    uma condio legal de forma contrria ao pargrafo 242 do BGB so tidos

    como abusivos e so, portanto, nulos.74

    No entanto, faz-se necessrio

    63BGH NJW 1992, 30264BGH LM 123 N 5265RGZ 111, 23366BGHZ 80, 8467Tribunal Superior de Hamburgo, NJW RR 1992, 139968Tribunal de Berlim, NJW RR 1989, 50569BGHZ 47, 21170Tribunal Regional de Trabalho de Mogncia, NJW 1985, 51071BAG DB 1986, 223872

    Tribunal Regional de Trabalho de Frankfurt a.M., BB 1987, 96873BGHZ 30, 145; BAG BB 1995, 20474BGHZ 12, 157

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    estabelecer os limites impostos pelo conceito da boa-f com base nas

    circunstncias de cada caso individualmente.

    4.1. Do significado do exerccio ilcito de direitos

    Assim, o pargrafo 242 do BGB acarreta uma situao de

    relatividade do contedo dos direitos. O exerccio de um direito contrrio a esta

    norma pode se tornar lcito se as circunstncias relevantes do caso se

    mudarem.75 No entanto, tal mudana das circunstncias relevantes do caso

    pode tornar o exerccio de um direito ilcito. H de se apreciar a situao do

    caso e suas circunstncias no momento do exerccio do direito.76

    Todavia, no se aplica esta regra no caso em que exista umanorma especfica regulamentando a matria, tais como o pargrafo 1587c,

    inciso 377, do BGB, no mbito da separao conjugal, ou as normas especficas

    para o processo administrativo da concesso de asilo poltico.78

    Basicamente, fala-se do exerccio ilcito de um direito quando se

    tem tal exerccio de um direito individual como nulo por contrariar o conceito da

    boa-f. Entretanto, o conceito da boa-f no limita apenas direitos individuais.

    Em sua funo como mandamento do comportamento probo e leal, a boa-f

    tambm limita instituies e normas de direito, proibindo, assim, tambm o

    abuso institucional do direito.

    4.2. Alguns casos especficos

    Existe um nmero expressivo de situaes capazes de

    configurarem o exerccio ilcito de direitos. Entretanto, no existe nenhuma

    classificao ou terminologia que goza de reconhecimento unnime entre os

    doutrinadores. Portanto, limitamo-nos a apresentar apenas algumas das

    configuraes predominantes dessa instituio.

    75BGHZ 12, 307; 52, 36876BGHZ 13, 35077Segundo esta norma, aquele cnjuge que deixa de cumprir, de maneira grosseira, seu dever

    de contribuir manuteno da famlia por um tempo prolongado, no far jus partilha doscrditos para a aposentadoria, quando da separao do outro cnjuge.78Tribunal Federal Constitucional BVerfG, NJW 1981, 1436

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    4.2.1. Da aquisio dolosa da prpria posio

    Considera-se ilcito o exerccio daquele direito adquirido pelo

    titular atravs de um comportamento contrrio lei, aos bons costumes e/ou

    contratos existentes.79Essa norma foi desenvolvida a partir da regra do direitoromano da exceptio doli specialis praeteriti. No sistema jurdico do common

    law ela conhecida como a doutrina das mos sujas (doctrine of unclean

    hands).

    No necessrio estabelecer culpa ou m-f para aplicar essa

    regra, basta um comportamento objetivamente mprobo.80 No entanto, tal

    comportamento deve ter gerado vantagens para o credor (o titular do direito) ou

    desvantagens para o devedor (aquele onerado pelo direito) no presentes aps

    um comportamento probo do credor. 81

    Assim, a execuo de um contrato celebrado por um

    representante excedendo visivelmente seus poderes de procurador nulo.82

    Da mesma forma o credor no pode exigir o cumprimento de um contrato pelo

    fiador se ele mesmo causou a inadimplncia do devedor.83 Uma multa

    contratual no pode ser cobrada, se o credor causou o comportamento geradorda multa.84 Tambm so incobrveis as despesas de uma notificao extra-

    judicial que resultou de mtodos mprobos de investigao.85Tambm no se

    pode exigir a troca de notas de dinheiro danificadas por sistemas de segurana

    durante um assalto, se tais notas foram adquiridas do prprio ladro.86

    4.2.2. Da infrao

    Em determinados casos o exerccio de um direito pode serconsiderado ilcito se tal uso implicar no descumprimento das obrigaes do

    titular do direito. Entretanto, isso no significa que somente aquele que sempre

    79BGHZ 57, 11180BGH LM (Cd) 242 N 581BGH LM (Cd) 242 N 22682BGHZ 94, 13883BGH, Wertpapier-Mitteilungen - WM 1984, 58684

    BGH NJW 1971, 112685Tribunal Regional de Munique, NJW-RR 1992, 73986Supremo Tribunal Administrativo BVerwG, NJW 1994, 954

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    se comportou em conformidade com as suas obrigaes possa exercer seus

    direitos.87

    Assim, o beneficirio continua tendo o direito ao pagamento de

    penso mesmo se descumpriu suas obrigaes face ao rgo da previdncia.Perde-se o direito penso excepcionalmente, por exemplo, no caso de o

    beneficirio estar colocando a capacidade financeira do devedor do benefcio

    em perigo,88cometendo o crime de extorso,89ou quando recebe pagamento

    de propina.90O advogado somente perde o direito de receber sua remunerao

    somente quando pratica atos contrrios aos interesses do seu cliente.91 O

    mesmo se aplica ao testamenteiro92e ao tutor.93

    4.2.3. Da falta do interesse legtimo

    A partir da regra do direito romano do exceptio doli generalis

    praesentis considera-se o exerccio de um direito sem interesse legtimo como

    contrrio boa-f.

    Falamos da falta de interesse legtimo quando o exerccio de um

    direito visa apenas alcanar vantagens ilcitas ou vantagens alheias relao

    contratual. Alm disso, cabem aqui os casos regulamentados pelo pargrafo

    226 do BGB que probe o exerccio de direitos com a finalidade de lesar

    terceiros.94

    Assim, vedado o exerccio da preferncia na compra de um

    imvel pelo poder pblico sem que haja interesse da comunidade na aquisio

    do imvel.95 Tambm no se pode invocar um direito contratual de

    consentimento somente para fins de receber pelo ato de consentir.96

    O direitocontratual de receber informaes sobre um empreendimento no pode ser

    87BGH NJW 1971, 1747; BAG DB 1974, 235788BGHZ 55, 27789BAG NJW 1984, 14190BGH NJW 1984, 153091RGZ 113, 269; BGH NJW 1981, 121292BGH Deutsche Notarzeitung- DNotZ, 1976, 55993RGZ 154, 11094 226 BGB: Die Ausbung eines Rechtes ist unzulssig, wenn sie nur den Zweck haben

    kann, einem anderen Schaden zuzufgen.95BGHZ 29, 11796BGHZ 107, 310

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    exercido, se tais informaes forem utilizadas na espionagem industrial.97Do

    mesmo modo, um scio no pode exigir a venda dos bens da sociedade a ser

    encerrada em leilo quando uma partilha amigvel entre os scios for possvel

    e vivel.98

    Merece meno especial o caso da solicitao de entrega de algo

    que deve ser devolvido em seguida. Segundo a jurisprudncia alem, nesse

    caso no h interesse legtimo para tal solicitao segundo a regra romana do

    dolo agit.99 100Dessa maneira, o proprietrio no pode exigir a devoluo de

    uma coisa de quem acabou comprando-a.101O proprietrio de um imvel no

    pode pedir a reintegrao de sua posse, se o possuidor tiver um direito

    contratual de celebrar um contrato de aluguel com o proprietrio.102Tambmno se pode executar uma hipoteca aps a quitao da dvida principal.103

    A justia alem tambm considera o exerccio de um direito

    contrrio boa-f, se h uma relao desequilibrada entre as vantagens pelo

    titular e as desvantagens que tal exerccio traria para o devedor.

    Assim, a reivindicao de pagamento de uma multa contratual

    prevista para o atraso de um pagamento contraria a boa-f, se tal atraso forinsignificante.104 O segurador no pode negar a cobertura contratual do

    segurado que deixou de pagar apenas umas parcelas insignificantes da taxa de

    seguros.105 Tambm contraria a boa-f a reivindicao de uma multa

    contratual, se a inadimplncia com a correspondente obrigao contratual no

    resulta em danos srios para o credor.106

    De qualquer forma, a boa-f obriga o credor a fazer uso da

    sano mais branda a sua disposio. Assim, cabe a resciso contratual por

    97BGHZ 93, 21198BGHZ 58, 14699Dolo agit, qui petit, quod statim est redditurus.100vide BGHZ 10, 75; 79, 204; 94, 246; 110, 33101BGHZ 10, 75 Nota-se que o pargrafo 985 do BGB define a propriedade como o direito deexigir a entrega do bem do possuidor do mesmo.102Tribunal Regional de Colnia, NJW-RR 1992, 1162103BGHZ 19, 206104

    RGZ 86, 335; 169, 143105BGHZ 21, 136106BGHZ 53, 160

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    justa causa somente aps uma infrutfera notificao.107 A excluso de um

    scio contraria a boa-f se houver a possibilidade de aplicar sanes mais

    brandas contra ele.108O mesmo se aplica na destituio de um procurador.109

    4.2.4. Da atuao contraditria (venire contra factum proprium)

    O ordenamento jurdico alemo no probe a atuao

    contraditria. facultado ao autor, em qualquer momento do processo civil,

    modificar os fundamentos de sua demanda. Da mesma forma, lcito o ru

    modificar a sua defesa. Qualquer uma das partes pode alegar a nulidade das

    suas declaraes prvias, sem temer sanes. Todavia, todo comportamento

    contraditrio considerado abusivo, ou seja, contraria a boa-f, desde que a

    outra parte possa e deva confiar naquilo que foi contradito,110 ou quando a

    contradio deve ser considerada abusiva luz das circunstncias do caso

    especfico.111

    vasto o nmero de casos em que a jurisprudncia alem aplica

    a proibio do venire contra factum proprium, o que nos obriga a mostrar

    apenas alguns casos meramente em carter exemplar.

    No mbito do direito de trabalho, abusiva a resciso de contrato

    de trabalho em um horrio inadequado, por exemplo, durante a madrugada.112

    Da mesma forma considerada abusiva a resciso motivada exclusivamente

    pela orientao sexual do trabalhador.113 Por outro lado, a reivindicao de

    frias pelo empregado impedido de trabalhar por motivo de doena no infringe

    a proibio do venire contra factum proprium.114 lcito tambm a reivindicao

    de auxlio-doena pelo empregado acidentado ao trabalhar num stio de sua

    propriedade.

    107BGH NJW 1981, 1265; BAG NJW 1989, 2493108BGHZ 16, 322109BGHZ 51, 203110BGHZ 32, 279; 94, 354111cf. Reinhard Singer, Das Verbot widersprchlichen Verhaltens, Munique 1993; BGH NJW1992, 834112

    BAG, Neue Zeitschrift fr Arbeitsrecht- NZA, 1989, 16113BAG BB 1995, 204114BAG, DB, 1972, 1245

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    No mbito do direito de famlia, os tribunais tm considerado

    abusiva a ao do cnjuge visando a anulao de matrimnio celebrado (sem

    observao das formalidades legais), perante um religioso, fora do territrio

    nacional durante a guerra, aps uma convivncia conjugal excedendo vinte

    anos.115 Da mesma forma, abusiva a ao anulatria do cnjuge bgamo

    visando exclusivamente a possibilidade de contrair o terceiro matrimnio.116O

    mesmo se aplica no caso em que o autor deixa de pedir a homologao da

    sentena de um tribunal estrangeiro decretando o divrcio do segundo

    casamento.117 Tambm considerado abusivo o questionamento da

    paternidade de quem consentiu a inseminao heterloga da me de uma

    criana.118No entanto, cabe criana o nus da prova pelo consentimento.119

    No direito das sucesses, o herdeiro secundrio no pode

    assumir a herana depois de assassinar o herdeiro primrio.120O herdeiro de

    uma pessoa incapaz no pode alegar a nulidade da venda de um imvel pelo

    falecido se ele colaborou na mesma.121

    O corretor no pode reclamar a exclusividade contratual, se ele

    deixou de trabalhar para o seu cliente por um perodo expressivo de tempo.122

    No entanto, no considerado abusivo se valer de uma informao obtida do

    corretor para fechar a compra de um imvel sem a participao dele, e,

    conseqentemente, sem o pagamento de sua comisso.123

    ilcito se basear numa clusula contratual de arbitragem para

    alegar a incompetncia absoluta de um tribunal em apreciar uma questo aps

    argir a nulidade desta mesma clusula em um processo prvio de

    115Tribunal Regional de Hamburgo, Zeitschrift fr das gesamte Familienrecht FamRZ, 1981,356; Tribunal Regional de Stuttgart, FamRZ 1963, 42116BGHZ 30, 146117BGH, Juristenzeitung JZ, 1962, 446118Tribunal Regional de Dsseldorf, FamRZ 1988, 762; Tribunal Regional de Hamm, NJW1944, 2425119BGH NJW-RR 1993, 643120BGH NJW 1968, 2051121BGHZ 44, 367122

    BGH NJW 1966, 1405123BGH NJW 1986, 178. No entanto, o corretor faz jus comisso se o imvel for compradopela mulher de seu contratante.

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    arbitragem,124 ou quando a arbitragem se tornou invivel devido

    inadimplncia de uma das partes.125

    4.2.5. Do conceito da perda de direitos (Verwirkung)

    Predominante entre os casos da atuao contraditria a perda

    de direitos. parte da viso germnica da boa-f a perda de direitos no

    exercidos durante um significante perodo de tempo, e aquelas pessoas

    oneradas por tais direitos podem e devem confiar que tais direitos no sero

    exercidos no futuro.126Considera-se desleal a demora excessiva no exerccio

    de um direito.

    Para poder constatar tal prescrio do direito necessrio adecorrncia de um perodo expressivo de tempo durante o qual o titular do

    direito ficou inativo. Determina-se o tempo necessrio luz das circunstncias

    de cada caso, observando-se, principalmente, a natureza do direito e sua

    acuidade,127e a intensidade da confiana do onerado128face s conseqncias

    do exerccio tardio. Assim, o tempo considerado necessrio fica diminudo por

    um comportamento do titular que deixa a impresso de que esteja abrindo mo

    do direito. Destarte, pode-se perder um direito contratual de resciso j aps adecorrncia de apenas umas semanas,129 enquanto em casos envolvendo

    outros tipos de direitos o perodo de 28 anos tem sido considerado

    insuficiente.130Em caso de dvidas sobre a existncia do direito, a espera do

    titular para o esclarecimento da situao jurdica no considerada como

    demorosa.131

    Durante este perodo o titular no deve ter feito nada que possa

    ser considerado como exerccio do direito. Desse modo, no haver perda de

    direitos se o titular deixou claro que vai se valer de seu direito, por exemplo

    atravs de uma notificao ou uma oposio.132

    124BGHZ 50, 191125BGHZ 102, 202126BGHZ 43, 292; 84, 281; 105, 298127BAGE 6, 168128Tribunal Regional de Frankfurt a.M., NJW-RR 1991, 678129BGH, Der Betriebs-Berater - BB, 1969, 383130

    BGH WM 1971, 1084131BGHZ 1, 8132BGH FamRZ 1988, 480

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    Avalia-se tambm, por outro lado, a posio do onerado a partir

    dos graus de sua confiana e do grau de seu conhecimento do caso.

    fundamental determinar se o onerado sabia necessariamente do existncia do

    direito em tela e se ele mesmo tinha boa-f.133No entanto, no necessrio

    que o titular esteja ciente da existncia de seu direito,134 basta apenas a

    possibilidade objetiva dele ter tido tal cincia.135 No haver perda, se o

    onerado esconde, ardilosamente, a existncia do direito ao titular.136

    Finalmente, necessrio o onerado ter confiado na desistncia do

    exerccio do direito e ter feito disposies correspondentes, fazendo com que o

    exerccio demorado do direito fosse um nus excessivo incompatvel com a

    boa-f.137 Especialmente em casos de reivindicaes atrasadas depagamentos de aluguel ou penso alimentar, a justia alem entende que h

    perda de direito se tais pagamentos ameaam a subsistncia do devedor, e tal

    ameaa seria inexistente se os pagamentos tivessem sido reclamados

    anteriormente deixando o devedor de consider-los no seu planejamento

    financeiro.138 Os tribunais tambm tm julgado direitos reivindicados

    tardiamente nos casos em que o atraso impossibilitou ao devedor o

    fornecimentos de provas da inexistncia da sua obrigao ou da quitao damesma.139

    No entanto, existem direitos que jamais caducam, tais como o

    direito de entrar na justia,140 ou os direitos de exigir a cesso de atos de

    concorrncia desleal141 ou do uso no autorizado da insgnia da Cruz

    Vermelha.142

    A perda de direitos constitui, igual s outras formas do exerccioilcito de direitos, uma limitao material do direito que o juiz deve apreciar ex

    133BGHZ 21, 83134RGZ 134, 41; BGHZ 25, 53135Tribunal Regional de Frankfurt a.M., NJW-RR, 1986, 593136BGHZ 25, 53137BGHZ 25, 52; 67, 68138BGHZ 103, 71139Tribunal de Trier, NJW-RR 1993, 55 (perda dos comprovantes de pagamento pelo devedor)140

    BGH NJW-RR 1990, 887141BGHZ 16, 93; BGH, Gewerblicher Rechtsschutz und Urheberrecht GRUR, 1985, 931142BGHZ 126, 287

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    officio.143 Para evit-la cabe ao titular do direito indicar quando exerceu ou

    reivindicou o direito. Por outro lado, cabe ao devedor o nus da prova que tal

    exerccio no aconteceu, bem como para a presena dos demais elementos

    necessrios para a perda.

    55..Do conceito do fundamento do negcio

    A relevncia da motivao (explcita e/ou tcita) do contratante no

    momento da celebrao do contrato tem sido objeto do debate jurdico h

    sculos. O princpio pacta sunt servanda inibe qualquer considerao do erro

    de motivo para poder levar em conta os interesses justos do contratado.144

    O antigo direito comum germnico considerou que a clausula

    rebus sic stantibus145 inerente a qualquer contrato, independente da presena

    de um entendimento das partes nesse sentido ou no. Da conclui-se que as

    partes deixam de serem vinculadas a um contrato se as condies especiais ou

    gerais presentes quando da celebrao do mesmo, venham a sofrer alteraes

    expressivas no momento da execuo desse contrato.

    Os pandectistas do sculo XVIII rejeitaram a doutrina da clausula

    rebus sic stantibuspor carecer de fundamento no direito romano e por esvaziar

    o princpio pacta sunt servanda.

    O doutrinador Windscheid colocou o problema na pauta do debate

    jurdico do sculo XIX com a sua doutrina da condio Lehre von der

    Voraussetzung. No entanto, esta teoria no se consolidou por no poder

    diferenciar o erro de motivo e a condio, e tambm por no levar em conta os

    interesses do contratado.

    O legislador do primeiro cdigo civil para o Reino da Prssia, o

    Allgemeines Landrecht ALR, de 1792, tentou codificar a clausula rebus sic

    stantubus nos seus pargrafos 377 e seguintes. No entanto, a mesma no

    143BGH NJW 1966, 345144Helmut Rssmann, Zweckfortfall und Wegfall der Geschftsgrundlage,

    http://ruessmann.jura.uni-sb.de/bvr99/Vorlesung/geschaeftsgrund.htm145Para a definio e abordagem da clausula rebus sic stantibus vide o ensaio de PauloRoberto da Silva Passos, Revista dos Tribunais N 647, pgs. 48 e segts.

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    conseguiu se estabelecer. J o BGB de 01.01.1900 no a incorporou, com

    exceo de algumas normas especializadas.

    Pode-se afirmar, portanto, que a doutrina da clausula rebus sic

    stantibusno constitui princpio do direito alemo atual.146

    Portanto, com o advento da hiperinflao na Alemanha aps a

    Primeira Guerra Mundial, a jurisprudncia se viu enfrentada com o problema de

    conciliar os princpios da boa-f, ou seja, a confiana do contratado na validade

    dos termos acordados entre as partes, com os interesses do contratante, para

    quem a adeso aos termos originais significariam uma ameaa para a sua

    subsistncia econmica. Ento, a justia comeou a conceder ao devedor o

    direito de renegociar ou at rescindir contratos existentes com base em

    fundamentos variados, tais como a doutrina da clausula rebus sic stantibus,147

    ou a impossibilidade econmica.148

    No entanto, a partir do ano 1923, luz da obra do doutrinador

    Oertmann,149 a jurisprudncia consagrou o fundamento do negcio como

    critrio nico da avaliao da alterao das circunstncias contratuais.150Essa

    posio no se modificou mais, nem aps a estabilizao econmica dos anosposteriores. A sua fundamentao legal o princpio da boa-f, ou seja, os

    pargrafos 157 e 242 do BGB.

    5.1. Definio do fundamento do negcio

    O fundamento do negcio uma circunstncia que, apesar de

    no constar nos termos do prprio contrato:

    era tido como pr-requisito pelo contratante para a celebrao

    do contrato de maneira evidente para o contratado;

    146RGZ 50, 257147RGZ 100, 130148

    RGZ 94, 47; 102, 273; 107, 157149Paul Oertmann, Die Geschftsgrundlage. Ein neuer Rechtsbegriff, 1921

    150RGZ 103, 332

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    era de tamanha relevncia para o contratante a fim de que

    este no celebrasse o contrato nos mesmos termos se tivesse

    acreditado na possibilidade de sua ausncia; e

    o contratado de boa-f no pudesse ter deixado de considerarse assim solicitado pelo contratante.

    Tal definio foi desenvolvida na tentativa de conter as

    conseqncias de distores graves nos fundamentos de contratos prevendo

    prestaes recprocas e mantendo-os em tamanho aceitvel.151

    5.2. Casos especficos

    Pode-se aplicar as regras do fundamento somente na ausncia de

    normas especficas que regulamentam a situao contratual, e na

    impossibilidade de alcanar uma soluo atravs da interpretao da vontade

    das partes em conformidade com a boa-f, como reza o pargrafo 157 do BGB.

    Em seguida, tratamos de algumas das situaes mais comuns para a aplicao

    das regras do fundamento do negcio.

    5.2.1. Da distoro da equivalncia (quivalenzstrung)

    O princpio da equivalncia entre a prestao e sua retribuio

    inerente ao contrato sinalagmtico, mesmo se no abordado pelas partes

    quando da negociao do mesmo.152 Caso a relao entre a prestao e a

    retribuio vier a sofrer alteraes graves, deve-se adaptar os termos do

    contrato s novas circunstncias.153

    No entanto, a perda de valor da moeda local no fundamenta aaplicabilidade das regras do fundamento do negcio.154 Da mesma forma, o

    pargrafo 242 do BGB no serve para fundamentar o direito do credor de poder

    exigir uma "correo monetria" das prestaes devidas a ele em um contrato

    de longo prazo.155 Cabe ao credor assumir o risco inflacionrio. Assim, a

    151BGH NJW 1993, 850152BGH NJW 1958, 906; 1959, 2203; 1962, 251153

    RGZ 147, 289; BGHZ 77, 198154BGHZ 86, 168; BGH NJW-RR 1993, 272155BGH NJW 1974, 1186

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    Assim, o pagamento contratual deve ser adaptado se ambas as

    partes erraram no seu clculo,160 ou se as partes aplicaram uma taxa de

    cmbio errada.161 A justia alem tambm tem aplicado o conceito do

    fundamento do negcio nos casos do erro mtuo das partes sobre a validade

    do passe de um jogador de futebol a ser transferido,162sobre o valor do objeto

    de um contrato de comodato,163 e sobre a possibilidade de obter um

    financiamento pblico para uma obra.164

    66..Concluso

    Com o presente artigo acreditamos ter mostrado como a

    jurisprudncia e doutrina tratam o conceito da boa-f na Alemanha, bem como

    os efeitos e as conseqncias desse tratamento.

    Certamente, algumas das regras estabelecidas ao longo do tempo

    na Alemanha no se aplicam ao Brasil. No objeto do presente ensaio

    pesquisar os motivos que levaram o conceito da boa-f a tomar outro rumo no

    Brasil.

    No entanto, acreditamos que era a inteno do legislador

    brasileiro se aproximar do conceito germnico da boa-f ao introduzir o

    conceito da funo social do contrato no Novo Cdigo Civil.

    Tal aproximao torna-se necessria, tendo em vista a

    consagrao, no cotidiano brasileiro, de prticas flagrantemente contrrias

    boa-f, tais como a imposio do reajuste monetrio das obrigaes de longo

    prazo, ou a aplicabilidade de multas contratuais exorbitantes imediatamente

    aps o vencimento de pagamentos, prticas essas sempre resultado do abusode poder econmico.

    Afinal, faz-se mister destacar a natureza objetiva e universal do

    conceito da boa-f. No h motivo para algo considerado abusivo na Alemanha

    ser lcito no Brasil e vice-versa.

    160BGH NJW 1995, 1428161RGZ 105, 406162BGH NJW 1966, 566163BGH NJW 1990, 2809 No caso, o objeto do comodato era um bar.

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    164 BGH NJW-RR 1990, 602